Thursday 31 December 2009

Aldeias esquecidas

No meio de tantos passos, assobios e levezas,
a finura de quem olha para isto
e finge que são grinaldas de malmequeres
bordados nos beirais de paredes de xisto.

São apenas franjas de aldeias esquecidas,
lugares deslocados e perdidos no tempo,
são estradas fantasmas que nos atraem
até às résteas de pedras caídas pelo vento.

Outrora aquecidas por mãos alegres e festas,
apenas encontro um cão a esgravatar o lixo,
veio de um acaso tal como eu apareci,
perdido do perdido, do país e do sítio.

Wednesday 30 December 2009

Bedding on boards




On the island of Mindanao, a child plays in front of his family’s temporary home in an evacuation centre on the front line between government forces and armed opposition fighters. While some families were able to find shelter in schools and public buildings, others are living more precariously, sometimes sleeping on little more than sections of cardboard.
(in: http://www.redcross.int/EN/mag/magazine2009_2/20-23.html)

Tuesday 29 December 2009

Ditching

Should he ditch his lover,
should he ditch a hole,
why did he ditched the car?
when the only thing he should search
is a pardon from his heart.

Uma Placa escondida e … o resto

Ver:

http://agualisa6.blogs.sapo.pt/1614269.html

Wednesday 23 December 2009

Vem lentamente

Vem ter comigo lentamente
de modo a que ninguém veja
que nenhuns olhos reparem
como és bonita - paciência.

Não existe caminho de saída,
apenas tens que aceitar o amor,
magnânimo como deve ser,
erguer velas a todo o vapor.

Com os pés de porcelana
passos delicados em pedras d'ouro
não sei porque esperas,
o que te faz ainda ter fôlego?

Minha casa de gota de água

Minha casa de gota de água,
refrescante, limpa, enorme,
fria por dentro, transparente p'ra rua,
que um dia se cria, noutro se dissolve.

Gota inchada de esperança,
que alegra alguém por instante,
encosto-me à parede mais que branca,
encharco-me, seco-me, penteio-te.

Sunday 20 December 2009

Inverno soturno

Agora que os meus sentimentos voltaram a pertencer-me,
o meu coração solitário voltou a bater,
os mesmos cheiros de saudosismo que me constituem começaram a aparecer
perto de alguém perdido no vento e no frio.
O açucar percorre as veias
para aquecer o sangue denso que bate num ser,
como nada mais que há em mim a não ser eu,
eu e só eu até ao fim,
porque quem estava ao meu lado desapareceu,
deixou-me neste campo coberto de neve de Inverno,
soturno e triste numa floresta densa de ramos esqueléticos,
tantos ramos que não vejo para além deles
e caminho no escuro às apalpadelas.
Tudo foge de mim,
como quem foge de um ser com lepra
com a face enegrecida,
onde já ninguém lhe quer pelo que parece
e esquecem que dentro dele só existe amor,
um pedido para lhe ouvirem,
um pedido para lhe compreenderem,
um pedido para pertencer a esta terra.

A Sereia

Estava deitado na praia,
perdido por entre grãos de areia,
escondido numa enseada,
apareceu-me uma sereia.

Pele de feitiço dourado
apoiou-se na minha beira,
olhei para ela de lado,
pensei que fosse da soleira.

Mas o cheiro a água salgada
provava que não era ilusão,
as palavras ditas do nada
vieram de alguém, não vieram do chão.

De pálpebras bem levantadas
olhou-me de forma singela,
pediu-me um beijo na cara,
pediu-me que fosse com ela.

Acordei na noite gelada,
reparei que era um sonho,
há anos que não tenho nada
a não ser trabalho enfadonho.

Thursday 17 December 2009

Lágrima de Preta (Extensão) - António Gedeão

Encontrei uma preta
que estava a chorar
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente,

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é de costume:

nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio,
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.

Hoje, troca-se o cloreto de sódio pelo transistor,
o preto pelo muçulmano, ou pelo israelita,
o ódio espalhou-se pelo mundo inteiro
não pela côr, mas pelo crescimento de um mundo irrealista.

Não há lume que queime as almas sem pudor
onde não compreendem a pena que vivem, ou que vivo,
não falo de cátedra porque sou o mais frágil que existe,
mas não me meto na boca do lobo ao primeiro motivo.

Posso ser pobre e morrer de fome,
mas a dignidade tem que persistir,
porque assim posso chorar com alegria,
e quando morrer, morro com a cabeça em riste.

Friday 11 December 2009

Eu

Eu vou partir para outro caminho,
não sei o que vai ser,
não sei quantas nuvens há-de ter,
nem sei quem vou encontrar.
Tudo o que faz um homem morreu
por causas naturais,
por mortes provocadas,
tudo o que resta de mim
é apenas ar e água,
sou apenas eu.

Fantasia

Amor num só sentido é fantasia
que consome apenas o dia a dia
que desmorona o ser em bocados.

Existem por aí muitos erectos,
mas que por dentro estão rebaixados
estão consumidos pelos factos.

É uma sombra cruel que se assombra
que persegue as pobres pequenas almas,
que desejam o que não se pode ter.

É alguém que morre mas não existe,
porque o amor só se faz aos pares,
algo que não desejo a ninguém. Sofrer.

Wednesday 2 December 2009

Guitarra portuguesa

O teu coração se enche
como o corpo desta guitarra
que o céu preenche
numa perfeita desgarrada.

Os teus dedos afiados
que agarram as cordas
e sem pudor arrancam
o coração das notas.

Lágrimas que caem
que duram para sempre
como o génio criado
por Carlos Paredes.

És português, és de ninguém,
és humilde de certeza,
és o dono da guitarra portuguesa.

Bala bífida

A falta de respeito e a ignorância
é como disparar uma bala bífida
mata o alvo e o ponto de partida.

"All grown-ups were children. Although, few of them remember it." - Antoine de Saint-Exupery (The Little Prince)

O mal deste país

O mal deste país são os socialistas,
são uma camada de individualistas,
cruéis por natureza da ignorância
disfarçada por uma falsa rebeldia.

São aqueles que afirmam a salvação,
que dizem que combatem contra o sistema,
são os primeiros a mandarem calar os dissidentes
porque não vão de acordo com o que eles pensam.

Afirmam-se transparentes por presunção,
querem mascarar-se em meninos inocentes,
são puristas e administradores ao mesmo tempo,
mas todos eles têm o rabo preso à parede.

Isto é tudo menos democracia,
é a ganância foraz e desmedida de uns
construída à custa de muita família.

...

Não deixes que a voz te engasgue,
utiliza a vírgula para respirar,
não deixes que a tua cara metade
te deixe alguma vez de te amar.

Vira ao contrário as interrogações,
transforma-as em iscos para ires pescar,
de todos os peixes que possas apanhar,
eles pertencerão sempre ao teu jantar.

Idem, idem, aspas, aspas,
tanto faz o que pensares,
a fila da esquerda ou da direita,
tanto faz a qual optares.

Ofereço-te estas reticências
para adicionares ao que tu quiseres,
para ver o quanto tens de paciência,
e vontade de te preencher.

Tuesday 1 December 2009

Soneto da Fidelidade - Vinicius de Moraes

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.