Monday 3 March 2008

Frasco de perfume

Rosa, perfume, cheiro, estou sentado à beira da cómoda. Com dois dedos tiro a tampa do frasco de cristal, boémio como o meu espírito, mas mais activo que a minha personalidade. É de certeza perfume digno de grande nobreza. Cheiro a ponta da tampa e sinto pequenos fios ondulantes a saracotearem-se pelo espaço, deixando partículas deliciosas pelo caminho.
Trata-se de um perfume subtil, em que se coloca duas gotas nos pulsos da mulher, encosta-se ao nariz e inspira-se com intensidade, enchendo os pulmões de sensualidade e relaxamento.
Eu tento ser feliz com a realidade, mas a imaginação consegue ser mais forte do que eu. Ela faz-me refém da vida e está constantemente a intrometer-se no caminho. Umas vezes voluntariamente, outras vez obrigada por terceiros. Eu não resisto à beleza. Trata-se da maior tentação existente.
Imagino-te à minha frente, sentada sobre a mesma cómoda a sacudires os cabelos e, logo de seguida, a afagá-los com uma escova branca, transmitindo-me paz.
Sentas-te na beira da cama, eu sento-me ao piano e começo a tocar uma melodia suave. Tento descrever pelas teclas o cheiro sublime que exalas. Cada sequência de harpejos tocados em pianíssimo corresponde a uma centelha de perfume.
Mas tu não estás ao pé de mim, estás num mundo inantingível. Ainda não nasci com o poder de criar almas. Fecho o frasco porque tenho que ir trabalhar.

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